CRÍTICA | DUNA (MINISSÉRIE – 2000)

 


Alejandro Jodorowsky tentou colocar sua visão de Duna, de Frank Herbert, nas telonas na década de 70, mas tudo o que conseguiu, muitos anos depois, foi ter sua epopeia lisérgica retratada em um documentário. Depois de muitas idas e vindas, o material acabou sendo adaptado para o Cinema em uma produção de Raffaella de Laurentiis com ninguém menos do que David Lynch na direção, resultando em uma obra visualmente fascinante, mas que deixava a desejar em relação à fidelidade ao material fonte. Foram necessários, então, mais 16 anos para que Duna ganhasse outra adaptação, desta vez na forma de minissérie televisiva pelo canal SyFy, então ainda chamado simplesmente de Sci Fi Channel, inaugurando seu catálogo invejável de obras do gênero.

Uma co-produção americana, canadense, alemã e italiana, cada episódio tem a duração de um longa-metragem e, em geral, o roteiro de John Harrison, que também foi o diretor, consegue dar conta de grande parte dos detalhes da obra literária original, sendo incomparavelmente mais próxima da visão de Herbert do que o filme de Lynch jamais fora. Visualmente, porém, o orçamento razoavelmente baixo para algo desse escopo (20 milhões de dólares) e a insistência no uso extenso de computação gráfica, tornam a minissérie absolutamente terrível em alguns momentos, algo que já era verdade no ano 2000, quando foi lançada, e que, claro, só foi acentuado ao longo dos anos.

Gráficos amadores mesmo para a época e uma direção de arte espalhafatosa que conta com figurinos de ficção científica trash e cenários pouco inspirados atrapalham e muito o aproveitamento do trabalho de Harrison, mesmo que ele tenha feito grande esforço para manter-se fiel ao livro de 1965. Mesmo com esses gravíssimos problemas, tenho para mim que o saldo é positivo já que a história mantem-se engajante, com personagens fascinantes e bem desenvolvidos, além de uma duração que permite que o espectador pelo menos sinta e internalize a saga de Paul Atreides (Alec Newman), filho do Duque Leto Atreides (William Hurt), que caminha na direção de tornar-se o líder do povo Fremen no planeta Arrakis, mais conhecido como Duna, que tem importantíssimo papel na geopolítica desse futuro longínquo por tratar-se do único lugar no universo onde existe a cobiçada especiaria que, dentre outras características, permite as viagens interplanetárias.

Se Newman demora a convencer com sua atuação travada no início, ele aos poucos vai incorporando seu papel que o leva de um herdeiro de uma casa da nobreza para o messias Muad’Dib de um povo oprimido, ganhando com imponência e enquadramentos que conseguem passar a mensagem necessária. A presença de William Hurt no começo ajuda nesse processo de passagem de tocha, digamos assim, com o experiente ator energizando a fita com seu ótimo trabalho dramático de praxe. Saskia Reeves como Lady Jessica, mãe de Paul e concubina de Leto, convence imediatamente com sua excelente presença de tela, por vezes até abafando Newman, algo que é amplificado quando o ator passa a ter que disputar os holofotes também com Barbora Kodetová que vive Chani, a Fremen que se torna interesse romântico de Paul. Mas o destaque dramático fica mesmo por conta do lado vilanesco imediato da história, a Casa Harkonnen, com Ian McNeice divertindo-se como o nojento Barão Vladimir Harkonnen, um ótimo contraponto histriônico e exagerado para o comedimento geral dos componentes da Casa Atreides.

O roteiro destaca a Princesa Irulan (Julie Cox), filha do Imperador Padishah Shaddam IV (Giancarlo Giannini beirando a canastrice), como narradora, mas ampliando seu papel de forma a melhor entremeá-la na narrativa como participante ativa, uma escolha muito interessante de Harrison que permite uma visão mais completa desse universo, já que, na obra original, o foco é constantemente nas duas casas inimigas, com o Imperador sendo muito mais uma figura mítica que só recebe destaque ao final. Com isso, o grande clímax da minissérie funciona bem, ainda que ele seja estranhamente rápido considerando a duração total da obra.

O mundo que Frank Herbert imaginou na década de 60 finalmente ganharia uma versão próxima de sua visão com a minissérie de John Harrison que continua interessante mesmo tanto tempo depois. Mas seu aproveitamento só será mesmo possível se o espectador de hoje souber perdoar e passar por cima da qualidade abissal do trabalho de computação gráfica da produção que chega a fazer os olhos doerem de tão ruim. Garanto uma coisa: a história é boa o suficiente para fazer valer a pena esse esforço.

Duna (Dune, EUA/Canadá/Alemanha/Itália – 2000)

Direção: John Harrison

Roteiro: John Harrison (baseado em romance Frank Herbert)

Elenco: William Hurt, Alec Newman, Saskia Reeves, James Watson, Jan Vlasák, P. H. Moriarty, Robert Russell, Laura Burton, Ian McNeice, Matt Keeslar, László I. Kish, Jan Unger, Giancarlo Giannini, Julie Cox, Miroslav Táborský, Uwe Ochsenknecht, Barbora Kodetová, Jakob Schwarz, Karel Dobrý, Christopher Lee Brown, Jaroslava Šiktancová, Zuzana Geislerová, Philip Lenkowsky

Duração: 265 min. (três partes)

RITTER FAN - PLANO CRÍTICO

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